Os debatedores da primeira live da Asfoc em 2021 (“O colapso da Saúde nos estados”) defenderam ontem (23/03) a necessidade de adoção de lockdown nacional para reduzir o ritmo de transmissão da Covid-19, o número de mortes no País e evitar o colapso do sistema de saúde público e privado na segunda onda do coronavírus no Brasil.
No dia em que o Brasil bateu recorde de óbitos em 24 horas (3.158) e se aproximou ainda mais da marca de 300 mil mortes desde o início da pandemia, a presidente do Sindicato, Mychelle Alves, afirmou que o confinamento e a vacina são as únicas medidas para retirar o País desta situação.
“Até quando teremos mais mortes antes dessa guerra acabar? Quantas mortes mais teremos para que esse governo negacionista e anticiência entenda que é preciso parar com essa pandemia?”, questionou ela, emocionada.
O vice-presidente da Asfoc, Paulo Garrido, ressaltou que o Brasil é o epicentro da crise sanitária mundial e atravessa o momento mais crítico de sua história. Para superar a pandemia, Paulinho disse ser necessário adotar lockdown nacional combinado com vacinação para toda a população, auxílio emergencial, políticas públicas e articulação entre os governos federal, estadual e municipal.
“As estruturas de atenção à saúde estão ameaçadas de colapso. Insumos cruciais como oxigênio e sedativos começam a dar sinais de desabastecimento. Enfrentamos ainda o esgotamento físico e emocional das equipes da linha de frente e a possibilidade de experimentar a falta de pessoal qualificado diante do aumento da demanda sobre os serviços de saúde”, lembrou.
Pesquisador da Fiocruz e diretor da Asfoc-SN, Marcos Besserman afirmou que este é o maior colapso hospitalar e sanitário da história do País. Assim como Mychelle Alves e Paulo Garrido, ele também defendeu o confinamento nacional como medida. “Para diminuir a transmissão do vírus, até hoje as evidências científicas só conhecem o isolamento social. Não há outra saída”, frisou.
Com alta nos casos de morte e transmissão da Covid-19, a cidade de Araraquara, em São Paulo, se tornou recentemente exemplo bem-sucedido no combate ao coronavírus. De 21 de fevereiro a 3 de março, a prefeitura local adotou lockdown, após comitê apresentar dados científicos e identificar a cepa P.1 – surgida em Manaus, mais transmissível e resistente – circulando na cidade.
Durante 10 dias o transporte público foi suspenso – 5 dias com tudo fechado, inclusive supermercados, funcionando apenas os serviços públicos e privados de saúde de emergência e farmácias.
Após a adoção da medida, a secretária de Saúde do município paulista, Eliana Mori Honaim, revelou que o número de internações caiu 39%. O número de pessoas positivadas nos testes de Covid-19 reduziu 53%; e o de pessoas monitoradas pelas equipes médicas da região saiu do pico de 1.500 por dia para 400. Como consequência, há 10 dias não existe paciente aguardando leito – a taxa de ocupação das enfermarias dos hospitais públicos é de 69% e das UTIs, de 84%.
“Estamos colhendo hoje os resultados do lockdown. Isso mostrou a efetividade do confinamento. Estamos há 20 dias do término do lockdown e ainda com uma fase bem restritiva”, destacou.
Porém, mesmo com o sucesso das medidas implementadas na região e os holofotes da mídia nacional voltados para Araraquara, ocorreu um fato inesperado. Nesta semana, Eliana foi ameaçada por um grupo negacionista, que divulgou seu endereço e convocou integrantes para fechar a rua onde mora. “Tínhamos dois caminhos na pandemia: a vacina, que vai a passos muito lentos no País, e o isolamento social. Em nenhum momento discutimos tratamento precoce”.
Procurador do Ministério Público do Amazonas, Ruy Marcelo admitiu que não só o negacionismo da população do estado atrapalhou no enfrentamento à Covid-19. “Na primeira onda, em abril do ano passado, enfrentamos grande dificuldade até de parte dos setores de gestão e da ciência sobre a postura diante da dúvida em relação ao grau de gravidade e vulnerabilidade do sistema de saúde. As reações populares, da gestão e do planejamento vieram atrasados em relação à velocidade do vírus. E logo veio o colapso”.
Ruy Marcelo afirmou que as pessoas acreditaram que o pior havia passado. Mas no fim de 2020, o abrandamento das medidas restritivas pelo governo do Estado aliado a uma suposição sobre imunidade de rebanho, junto com a detecção de uma nova variante (P.1) e a falta de oxigênio na rede hospitalar levaram o sistema de saúde a um novo colapso (segunda onda).
“As autoridades não tiveram uma indicação clara e não fizeram propagar esse perigo no fim do ano. Infelizmente, em meados de janeiro, o que vimos foram dezenas de mortes por asfixia, pela intermitência do abastecimento de oxigênio hospitalar nas unidades de saúde. A partir deste momento foi uma estratégia de guerra, num cenário catastrófico, horroroso, de pessoas morrendo sem assistência. E a rede colapsada, sem os insumos necessários”, relembrou.
Acesse o link para assistir ao debate na íntegra: https://www.facebook.com/asfocsn/videos/440684037041588/