Pesquisar

Notícias

Nota de solidariedade aos trabalhadores do IBGE. Em defesa do censo 2020

Um verdadeiro clima de terror e obscurantismo se instalou no IBGE. Demissões, caça às bruxas, autoritarismo e injustiça marcam a conjuntura experimentada pelos trabalhadores do instituto. O presidente Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes vêm demonstrando total desconhecimento sobre o trabalho realizado pelo IBGE e reservado muita arrogância e grande desrespeito para os trabalhadores do instituto. A Asfoc-SN manifesta solidariedade total aos trabalhadores do IBGE e se coloca terminantemente contra os ataques que a instituição vem sofrendo por parte de um governo que já evidenciou não zelar pela defesa da educação, da ciência, da tecnologia e da cultura como elementos essenciais ao progresso econômico e à construção de um projeto civilizatório, inclusivo e ambientalmente responsável. Os cortes e contingenciamentos que atingiram essas áreas – juntamente com o desmonte das instituições do meio ambiente, a liberação indiscriminada de agrotóxicos e a intenção de reduzir os impostos sobre cigarros – demonstram, de forma inequívoca, como o governo está voltado para o atendimento das demandas de segmentos econômicos mesquinhos em detrimento dos interesses mais elevados do país.

Criado há 83 anos, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística já deu inúmeras provas da excelente qualidade do trabalho que realiza. Um trabalho reconhecido internacionalmente e que sustenta políticas públicas e orienta a ação de inúmeras instituições que se debruçam sobre o país e seus problemas. Um trabalho sério, competente e comprometido com o Brasil. Um trabalho rico, gerador de bases de dados imprescindíveis ao planejamento e monitoramento de políticas públicas. Bases de dados constantemente atualizadas e utilizadas por pesquisadores e instituições públicas e privadas de todo o país e do exterior.

Do nosso ponto de vista, de trabalhadores e militantes da saúde pública, não há como coordenar de modo adequado e eficiente as políticas públicas de saúde e o desenvolvimento do SUS sem os indicadores e as informações produzidas pelo IBGE.

Alterar abruptamente uma metodologia construída ao longo de décadas e reconhecida internacionalmente, sem discussão ou racionalidade que justifique tal atitude, se constitui em verdadeiro atentado à lógica e um completo desrespeito ao trabalho realizado com brilhantismo pelo IBGE e seus técnicos. Um ataque sem precedentes sobre um bem público. Um ataque a um patrimônio do povo brasileiro. Um patrimônio que serve de exemplo para o mundo.

A Asfoc-SN se soma à Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (ABET) e subscreve a posição por ela assumida ao afirmar que: “O Censo Demográfico tem inquestionável centralidade para o planejamento governamental – e também para o setor privado – em todas as áreas, sendo a principal fonte de informações sobre múltiplas dimensões da população brasileira em escalas municipal, estadual e federal. A sua simplificação, ao argumento de escassez de recursos, ignora que o Censo Demográfico é, de fato, um investimento indispensável para a concepção e gestão eficazes de políticas públicas que atendam as demandas da população, evitando desperdícios e assegurando o bom uso dos recursos públicos”.

A audiência pública realizada recentemente no Congresso Nacional debateu pontos de grande relevo para a compreensão do que está em jogo na realização do censo 2020. Uma discussão que não pode ser ignorada pela sociedade e pelo governo.

Ouvido no Congresso, Eduardo Pereira Nunes, ex-presidente do IBGE, abordou temas como o volume de recursos e as possibilidades de alteração na forma de realizar o censo. De acordo com a sua visão, a escassez de recursos não pode ser usada como justificativa para cortes no questionário a ser utilizado no próximo censo. Segundo o ex-presidente do instituto, o que pesa no custo do censo não é o número de perguntas, mas a logística necessária para realizá-lo. Para ele não há razão técnica ou orçamentária para sustentar a alteração pretendida pelo governo. Eduardo Pereira Nunes argumenta que se dividirmos o orçamento de, aproximadamente, 3 bilhões de reais por 200 milhões de habitantes (números arredondados), a aplicação do questionário sai por R$ 15,00 em uma década ou R$ 1,50 por ano. Um custo irrisório frente aos benefícios derivados do uso responsável das informações obtidas pelo censo.

O ex-presidente lembrou também que o IBGE realiza, desde 2004, estudos de modelos alternativos de censo e que esses estudos não apontam para a redução do questionário, mas, sim, para a proposição de um censo contínuo capaz de diluir o impacto dos custos decenais ao longo dos anos.

Nós, da Asfoc-SN, entendemos que o trabalho competente de anos, balizado por critérios de abrangência, compatibilidade e comparação requeridos em um investimento de tal envergadura, não pode ser substituído, de modo repentino e atabalhoado. A Asfoc-SN considera extremamente arriscado e irresponsável promover alterações de vulto e em confronto com a orientação técnica de profissionais respeitados no mundo inteiro pela excelência teórico-metodológica e pelos resultados práticos apresentados como resultado do trabalho de equipe. Não há justificativas razoáveis para as tentativas de substituição da equipe e do trabalho realizado com sucesso pelo IGBE. Consideramos como ideológica, injustificada e prejudicial aos interesses do país a intervenção que se quer realizar no IBGE e no censo de 2020.

A substituição da abrangência e da qualidade da metodologia estudada há anos pela eventual adoção – pouco criteriosa, açodada e carente de sustentação técnica – de registros administrativos, aplicação de questionários pela internet ou pesquisas de cunho amostral não nos parece propostas exequíveis em tão pouco tempo. A argumentação da utilização de registros administrativos, por exemplo, não se apoia em bases sólidas e tem sido empregada de modo irresponsável. Os técnicos alertam para o fato de que não há como utilizar esses registros sem um trabalho prévio e gigantesco de organização nacional dessas bases. Não é um trabalho que se faça de uma hora para outra.

Lembramos que o trabalho do IBGE se baseia em larga experiência empírica, forte domínio teórico-metodológico, estudos de casos, simulações diversas, consultas públicas e provas pilotos realizadas em campo. Um trabalho lastreado por escuta. Um trabalho distante da autossuficiência tecnocrática que pretende substituir tudo que já foi realizado até aqui sem justificativa razoável. Uma substituição que nos aparece, no mínimo, estranha e desprovida de lógica republicana.

Nessa perspectiva, repudiamos a intervenção em curso no IBGE e as mudanças, sem a devida sustentação técnica, da metodologia a ser utilizada no próximo censo. Manifestamos mais uma vez nossa solidariedade e nosso respeito ao corpo técnico e demais trabalhadores do instituto. Lembramos ainda que, para além de qualquer governo, está o interesse público.

Últimas Notícias