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Carta aberta dos trabalhadores de Farmanguinhos/Fiocruz

1. Os trabalhadores do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz), laboratório farmacêutico oficial vinculado ao Ministério da Saúde, tornam pública a situação de insegurança a qual estão expostos diariamente em decorrência do agravo da violência no entorno do Complexo Tecnológico de Medicamentos (CTM), localizado na Avenida Comandante Guaranys, 447, Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio de Janeiro.

2. Esta via, na qual estamos sediados, é um importante ponto de ligação entre a Estrada dos Bandeirantes e a Cidade de Deus, uma das principais comunidades do Rio de Janeiro, com mais de 10 mil famílias em situação de pobreza, de acordo com dados da Assessoria de Gestão Social da unidade. Além da miséria, essa população enfrenta o crescimento desenfreado e alarmante da violência e a falta de acesso a serviços essenciais, tais como saúde, educação e habitação.

3. Desde 2004, a fábrica de medicamentos de Farmanguinhos foi transferida para este campus, o CTM, onde circulam aproximadamente mil pessoas diariamente, dentre os quais: alunos, fornecedores, bolsistas, estagiários, trabalhadores e visitantes. Além de pesquisar e desenvolver novas formulações farmacêuticas, aqui produzimos medicamentos essenciais para abastecer o Sistema Único de Saúde (SUS) de modo a contribuir para a saúde da população brasileira.

4. Para entender a importância que a fábrica representa para o país, anualmente, saem daqui milhões de unidades farmacêuticas de medicamentos para todo o Brasil, dentre os quais, antirretrovirais, antivirais, tuberculostáticos, imunossupressores, antiparkinsoniano, antimaláricos, e tantos outros que possibilitam que mais pessoas tenham acesso a um tratamento digno e de alta qualidade tecnológica.

5. Esta unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz é mais do que uma fábrica de medicamentos, é um verdadeiro instituto de ciência e tecnologia em saúde. Além de pesquisar, desenvolver e produzir medicamentos essenciais para a população brasileira, destaca-se ainda na luta pela redução de custos de fármacos e medicamentos, permitindo a ampliação do acesso de mais pessoas aos programas de saúde pública. Além de empregar de forma indireta mais de seis mil pessoas na região, entre empregos diretos, familiares e empresas prestadoras de serviços em geral.

6. Tendo em vista a complexidade das nossas operações, o CTM funciona de forma ininterrupta, com a maior parte da equipe de trabalho concentrada entre 6h e 22h, de segunda a sexta-feira. Nos últimos meses, temos trabalhado também nos fins de semana, a fim de suprir o SUS com medicamentos essenciais.

7. Levando em consideração a relevância que este Instituto representa para o país, e diante da alta vulnerabilidade a qual estamos expostos, nós, trabalhadores de Farmanguinhos/Fiocruz, entendemos ser premente a busca por soluções a fim de garantir o direito de ir e vir sem colocar em risco a integridade física de cada pessoa que aqui atua.

8. Ressaltamos que a Avenida Comandante Guaranys, na qual estamos situados, tem sofrido um acelerado processo de degradação. Desde de 2015, a região vem sendo alvo de ocupações irregulares, com a construção de residências precárias, que, dentre os diversos problemas sanitários, tem gerado obstruções progressivas nesta importante via de acesso ao laboratório.

9. O sentido da avenida encontra-se constantemente fechado com entulhos e barricadas, o que dificulta o ingresso ao Instituto pelas vias normais. Desta forma, o reabastecimento de suprimentos também tem sido impactado por conta da insegurança que se estabeleceu no entorno, uma vez que diversos fornecedores encontram dificuldade de acessar a unidade por empecilhos que inviabilizam a passagem dos veículos. Tal situação coloca em severos riscos o processo de suprimento institucional e, consequentemente, o abastecimento do SUS.

10. Nos últimos anos, temos enfrentado uma série de problemas ocasionados pelo aumento da insegurança, dentre os quais, a presença frequente de pessoas fortemente armadas transitando no entorno, bem como abordagens e intimidações.

11. Recentemente, uma colega foi atingida por estilhaços de bala quando chegava à fábrica, por conta do confronto armado nas vias de acesso à fábrica. No mesmo episódio, carros de alguns trabalhadores foram também alvejados pelos projéteis. Embora a Instituição venha mantendo contato com os órgãos de segurança pública, não é possível notar mudança da situação de abandono em que a população se encontra.

12. Diante da vulnerabilidade e incapacidade para lidar com essa situação de alta periculosidade, diversas empresas vizinhas já encerraram suas atividades. Tal evasão industrial contribui para o enfraquecimento do estado do Rio de Janeiro, uma vez que milhares de empregos diretos e indiretos já estão sendo impactados, além da redução da arrecadação de impostos e tributos, atualmente tão escassos em nosso estado.

13. Em relação a Farmanguinhos, tem-se trabalhado internamente com orientações e medidas para prevenir a exposição de colaboradores, alunos e visitantes à situação de insegurança e abordagens ostensivas, bem como realização de operações da polícia nos horários já mencionados, em que ocorre maior fluxo de trabalhadores nas vias externas.

14. A instituição tem dado uma atenção especial a todas as pessoas que passam por situação de risco. Além do tratamento humanizado, a área da Saúde do Trabalhador tem acompanhado o estado de saúde emocional dos colaboradores. Até o momento, foram registrados dezenas de casos de trabalhadores com distúrbios emocionais, problemas psicológicos, medo, estresse e insegurança, causados pela exposição frequente a riscos. Por esta razão, tem-se ocorrido casos de evasão de trabalhadores e o aumento de absenteísmo.

15. Externamente, Farmanguinhos continua buscando diálogos com as comunidades locais, por meio de projetos sociais e ações de cidadania. Dentre as iniciativas, a instituição realiza anualmente a Páscoa Solidária e o Natal Solidário, ambos os projetos são viabilizados graças ao engajamento dos trabalhadores, que adotam e presenteiam as crianças. Além disso, a unidade executa o projeto Se essa rua fosse minha, que tem como objetivo a revitalização da Avenida Comandante Guaranys, de modo a oferecer mais dignidade para a população local.

16. É importante ainda ressaltar a real necessidade de implantação de serviços públicos à população local. Observa-se que não há saneamento básico, nem iluminação. Além disso, não há limpeza nem coleta regular de lixo. É preciso revitalizar a área e criar condições para uso recreativo do espaço público.

17. Tendo em vista o relato apresentado no presente documento, atestamos que a continuidade de nossas atividades laboratoriais e industriais, na atual localização de Jacarepaguá, está gravemente comprometida, ocasionando impactos negativos para o estado do Rio de Janeiro e para a saúde pública brasileira como um todo, colocando em risco o atendimento das demandas do SUS e, em especial, aos programas de DST/Aids, Malária, Tuberculose, entre outras endemias focais, cujo combate é de relevância estratégica para o país.

18. Diante do exposto, este documento tem como objetivo cientificar as autoridades internas e externas à Fiocruz da situação alarmante que tem se instaurado nas proximidades do Complexo Tecnológico de Medicamentos, e que coloca em risco diretamente a segurança dos trabalhadores, a população do entorno e, consequentemente, a manutenção das atividades de Farmanguinhos.

19. Desta forma, solicitamos a intervenção do Governo Estadual para garantir a segurança pública e o direito de ir e vir; solicitamos ainda uma atuação do Governo Municipal, responsável pelo planejamento e execução de serviços públicos, tais como os de infraestrutura, saúde e educação; no âmbito federal esperamos maior colaboração na busca por soluções de proteção aos trabalhadores vinculados ao Ministério da Saúde. Por fim, esperamos contar com o apoio da Presidência da Fundação Oswaldo Cruz, e da Associação dos Servidores (Asfoc), de modo a viabilizar a inclusão deste tema na agenda parlamentar.

20. Neste sentido, é premente a intervenção do poder público em suas diversas esferas, garantindo a segurança e o direito de ir e vir dos trabalhadores e da população local e consequente manutenção das atividades fabris do CTM. Ao Governo Municipal, responsável pelo planejamento e execução de serviços públicos, pleiteamos a observância e cumprimento do plano diretor municipal, com adoção de medidas concretas que garantam iluminação, limpeza da via, fiscalização no avanço de moradias irregulares.

21. No âmbito estadual, que sejam adotadas ações de inteligência com estratégias, no sentido de garantir a segurança pública para a região.

22. Na esfera federal esperamos maior colaboração na busca por soluções de proteção aos trabalhadores vinculados ao Ministério da Saúde.

23. Aos membros do poder legislativo das esferas municipal, estadual e federal, que auxilie na fiscalização e no devido cumprimento das reinvindicações.

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